Retorna a Arnaldo Jabor |
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MEDITAÇÕES DIANTE DO BUMBUM DE JULIANA No Brasil, o bumbum virou um capital com vida própria Nos últimos dias, só houve dois assuntos nesse bendito país: a gafe do Lula com o jornalista e o bumbum de Juliana Paes na “Playboy”. Prefiro o bumbum de Juliana. Ia escrever sobre a babaquice do Lula, mas creio que o outro assunto é mais “palpável” do que esse governo especializado em alternar lentíssimas indecisões com arroubos ridículos, “assembleísmos” leninistas com gestos bruscos que, em geral, têm de ser consertados depois. Mas, não adianta repetir o óbvio para surdos. Vamos ao que interessa: o bumbum era esperado como um messias redentor, aguardado como a salvação do país nesse momento sem graça. Políticos, bancários, eu, todos ansiávamos por esse bumbum como por um “Maomé”, um profeta. O que poderia nos revelar esse bumbum? Corri para as bancas e comprei a “Playboy” sob o olhar debochado do jornaleiro que me reconheceu e perguntou se eu não ia levar o “The Economist” também. “Claro, claro...”, respondi, vermelho. Chego em casa, rasgo a capa de plástico com as mãos trêmulas, abro com uma sensação de pecado e esperança e vejo Juliana Paes em seu esplendor. Folheio a revista e caio numa perplexidade muda. Antes de continuar, devo
dizer que já escrevi sobre o bumbum da Feiticeira, o bumbum da Tiazinha e
continuo sem uma palavra apropriada. Não há na língua portuguesa um termo
corrente para essa parte do corpo. A palavra “bunda” tem uma conotação
pejorativa, um substantivo já adjetivado de saída. Há eufemismos como
“traseiro” ou metonímias como “nádegas”, “glúteos” etc... Portanto, “bunda”
é a palavra certa. Muito bem; com todo respeito, a bunda de Juliana me
deixou aparvalhado. Não sei se esperava muito; só sei que fui tomado por uma
funda decepção. Não sobre beleza da bunda, pois é muito bonita sim, mas pelo
choque de realidade que me trouxe. Afinal, verificamos que era apenas uma
bunda e não um enviado de Deus, era apenas uma moça que nos parece gentil,
romântica, bondosa como uma babá, mostrando o bumbum como um bebê
recém-nascido. Ela sorri, parecendo dizer: “É só isso o que vocês queriam?
Ora... pois aqui está minha bundinha...” Olhei o bumbum de Juliana por todos
os ângulos, e nada aconteceu, sexual e filosoficamente. Confesso, Juliana,
com todo o respeito, que imaginei cenas eróticas comigo mesmo, com outros e
nada senti... Pensei: “Estou decadente, ou as uvas estão verdes...”. Mas,
não; não era isso. Bateu-me mesmo uma certa tristeza, de ver aquela moça
ali, satisfazendo nosso desejo bruto e invasivo, esse povo de onanistas e
sodomitas sempre desejando a mulher por trás. Senti um vazio ao ver um
segredo revelado, estragando com sua nudez meridiana a gloria da moça da Daí, me bateu a verdade inapelável e cruel: a bunda não existe. Só existe a “idéia” de bunda, o conceito platônico de bunda. Isso. No caso de Juliana, o bumbum real destrói o bumbum imaginário. Sempre sonhamos com aquele bumbum adivinhado sob os vestidos na novela e ele tinha a multidimensão rica de uma metáfora. Ele era todos os bumbuns, ele era uma promessa de vida em nossos corações. Mas, diante do bumbum real a vida perdeu o mistério, tudo se aquietou na paz da anatomia óbvia. O bumbum deixou de ser uma utopia e só restou o bumbum possível. Vemos, com clareza e realismo, que virou um bumbum mortal, sem transcendência, que é apenas um bom bumbum brasileiro, que um dia cairá, como o PT. Por isso, me pergunto por
que a bunda é nosso símbolo? Para os anglo-saxões são os seios, leiteiros,
alimentícios. O bumbum para nós, ibéricos, é menos inquietante que a vagina;
essa nos lembra fecundidade, essa nos coloca Por isso, afirmo que o bumbum de Juliana, por mais caras perversas que ela faça na revista, é uma bunda romântica, familiar. O rosto maternal de Juliana prejudica o desempenho de seu bumbum. No caso de Tiazinha ou da Feiticeira, a bunda tinha vida própria. Era mais importante que as donas. Muitas mulheres de bonitas bundas chegam a ter ciúmes de si mesmas e têm uma atitude envergonhada de suas formas calipígias. A mulher de bunda bonita caminha como se fossem duas: ela e sua bunda. Uma fala e ninguém ouve; a outra cala e todos olham. A mulher de bunda bonita não tem sossego; está sempre autoconsciente do tesouro que reboca. A mulher de bunda bonita mesmo de frente está sempre de costas. A mulher de bunda bonita vive angustiada - quem é amada? Ela ou sua bunda? Algumas bundas até parecem ter pena de suas donas e quase dizem: “Olhem para ela também, ouçam suas opiniões, sentimentos... Ela também é legal...”. Mas, a verdade é econômica.
A bunda hoje no Brasil é um ativo. Centenas, milhares de moças bonitas
usam-na como um emprego informal, um instrumento de ascensão social. A
globalização da economia está nos deixando sem calças. Sobrou-nos a bunda...
nosso único capital. |